Uma prática comum no curso das ações de recuperação de crédito é a pesquisa patrimonial, também chamada de pesquisa de bens ou busca de bens, cuja finalidade é a localização de bens de propriedade da parte devedora que sejam passíveis de penhora para saldar o débito em execução.
Por estarmos numa sociedade conectada à Internet, com informações pessoais circulando nas redes, a pesquisa patrimonial se torna mais acessível, dentro e fora do Poder Judiciário.
Informações sobre ativos financeiros, bens móveis ou imóveis em nome das partes devedoras podem ser consultadas pelo Poder Judiciário, através da utilização de ferramentas eletrônicas de pesquisa patrimonial elaboradas com informações oriundas de bases de dados de instituições públicas e privadas.
De forma privada, a parte credora pode acessar informações sobre patrimônio da parte devedora através de plataformas conveniadas (Registro Civil, Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado – SAEC), sites de órgãos públicos (Detran, Sistema Nacional de Gravame – SNG, Portal da Transparência) e demais ferramentas disponibilizadas na rede para essa finalidade.
Neste contexto, quais são as diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que dispõem sobre a consulta e o compartilhamento de dados pessoais de titularidade da parte devedora em ações de recuperação de crédito?
Para responder a esta pergunta, temos que no art. 6º da Lei nº 13.709/2018 dispõe como diretrizes para o tratamento de dados pessoais a boa-fé, e os demais princípios: I – finalidade; II – adequação; III – necessidade; IV – livre acesso; V – qualidade dos dados; VI – transparência; VII – segurança; VIII – prevenção; IX – não discriminação; X – responsabilização e prestação de contas.
Vejamos como essas diretrizes são aplicadas na pesquisa patrimonial:
Princípio de Tratamento de Dado Pessoal (LGPD) | Aplicação na Pesquisa Patrimonial |
Finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades. | Finalidade: o propósito da pesquisa patrimonial é encontrar bens que sejam passíveis de saldar o débito em execução, e não há necessidade de tratamento dos dados obtidos para finalidade diversa. |
Adequação: compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao titular, de acordo com o contexto do tratamento. | Adequação: a partir das informações obtidas pelo Poder Judiciário ou de forma privada, tomamos a melhor decisão para a ação, visando o interesse do cliente. |
Necessidade: limitação do tratamento ao mínimo necessário para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados. | Necessidade: em conformidade com o art. 831 e seguintes do CPC, não excedemos o limite legal para a realização da penhora sobre os bens eventualmente encontrados. |
Livre acesso: garantia, aos titulares, de consulta facilitada e gratuita sobre a forma e a duração do tratamento, bem como sobre a integralidade de seus dados pessoais. | Livre acesso: a parte devedora, figurando no polo passivo da ação, terá pleno acesso aos documentos e às petições juntadas nos autos. |
Qualidade dos dados: garantia, aos titulares, de exatidão, clareza, relevância e atualização dos dados, de acordo com a necessidade e para o cumprimento da finalidade de seu tratamento. | Qualidade dos dados: procuramos nos certificar da exatidão, clareza, relevância e atualização dos dados obtidos sobre bens penhoráveis para a satisfação do crédito. |
Transparência: garantia, aos titulares, de informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento e os respectivos agentes de tratamento, observados os segredos comercial e industrial. | Transparência: o Poder Judiciário garante o livre acesso das partes interessadas ao conteúdo dos processos de recuperação de crédito, e as ferramentas de pesquisa utilizadas ou passíveis de utilização. |
Segurança: utilização de medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão. | Segurança: caso julgar necessário, a autoridade do Poder Judiciário pode determinar o curso de uma ação em segredo de Justiça, visando à proteção de dados pessoais e dados pessoais sensíveis encontrados nas pesquisas patrimoniais. Esta medida também visa prevenir a ocorrência de danos em virtude do tratamento dos dados pessoais e dados pessoais sensíveis. |
Prevenção: adoção de medidas para prevenir a ocorrência de danos em virtude do tratamento de dados pessoais. | |
Não discriminação: impossibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos. | Não discriminação: a pesquisa patrimonial visa tão somente à localização de bens passíveis de penhora para saldar a execução, de modo que não há possibilidade de utilização dessas informações para fins discriminatórios ou abusivos. |
Responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das normas de proteção de dados pessoais e, inclusive, da eficácia dessas medidas. | Responsabilização e prestação de contas: a parte credora, assim como o Poder Judiciário, se responsabiliza pela utilização das informações obtidas em pesquisas patrimoniais dentro dos parâmetros legais, sob pena de sanção por ato atentatório contra a dignidade da Justiça. |
Dessa forma, verifica-se que a pesquisa patrimonial é uma prática validada no ordenamento jurídico nacional, podendo ser utilizada inclusive pelo Poder Judiciário, e sua realização de forma privada pela parte credora deve atender às diretrizes estabelecidas pelo próprio Poder Judiciário, de modo que fica assegurado o tratamento dos dados pessoais da parte devedora em conformidade com os princípios estabelecidos pela LGPD.